A MULHER DO
CARPINTEIRO
Sentada na calçada, numa velha cadeira
com assento de couro, vestida em um vestidinho de chita com umas pregas na
cintura destacando o quadril. Os seios exuberantes saltavam ao decote, uma
fivela em forma de flor enfeitava os negros cabelos. Vaidosa, colocava uma base
no rosto deixando rósea a face, o forte cheiro de leite de rosas, sentia quem
passasse próximo. Rosa guardava a beleza rustica regada por uma falta de
recursos que, se os tivessem, não haveria criatura mais bela na terra. Sempre
ao cair do sol presenciava esta cena, ela sentadinha com as mãos no colo,
evitava qualquer possibilidade de visão privilegiada. Você entende não é ?
Ansiosa ficava um bom tempo à espera do humilde carpinteiro retornando do
trabalho. As nossas residências ficavam em um vilarejo a pouco mais de dois
quilômetros da pequena cidade onde trabalhava o marido.
Diante da falta de recurso, dinheiro
poderia ser o bem maior para seu mundo, no entanto, nada mais dava satisfação à
doce camponês, a certeza de ter todos os dias, a volta do seu carpinteiro,
esposo amado. Quando chegava, antes de entrar em casa, já na calçada, abraçava
a esposa, passava a mão no cabelo e dizia: nada neste mundo é mais bonito do
que a alegria nos olhos teus. Envaidecida com elogio do marido, colocava os
cabelos para frente, timidamente sorria.
Aquela jovem senhora chamava muito
atenção, além da beleza rustica, tinha uma sensualidade tão natural, chegava
ser despretensiosa. Certa vez, estive a observar, quando varria a calçada, o
vai e vem dos braços varrendo, fazia ela requebrar sem querer, não imagina como
aquilo era lindo, divinamente voluntariosa. Tê-la tornou-se uma questão de
honra. Eu queria fazê-la minha, repetia aquilo cotidianamente, feito um monge
tibetano repetindo um mantra. Junho se aproximava, no sertão havendo inverno,
não há lugar melhor de se festejar o São João. Fogueiras, milho assado,
pamonha, sanfoneiro e o arrasta pés à noite toda no terreiro de terra
batida. Aquele ano foi razoável, não foi um dos melhores, mas fiz de tudo
para lá em casa, fazer o nosso São João, afinal não podíamos fazer essa
desfeita com o santo. São João merecia a festa, e eu queria Rosinha, isso já
era motivo de sobra para festejar.
Finalmente, aconteceu a festa, lembra da
brincadeira se comprometendo com o santo? Aquelas em que duas pessoas, uma
fica de um lado da fogueira e a outra pessoa fica do outro lado, ambas estendem
as mãos pegando uma na outra, dependendo do compromisso, diz: são João disse e
são Pedro confirmou para..., pois é, fizemos a brincadeira no terreiro,
enquanto o marido aproveitava os quitutes e uma forte caipirinha, peguei na mão
de Rosinha, corremos para a fogueira começamos o ritual: São João disse e São Pedro
confirmou, e antes que ela falasse, me pronunciei logo, para eu ser seu marido
que são João mandou. Ela olhou, sorriu, apertou a mão, deu as costas e
saiu. Rosa estava muito bonita! Aliás, era bonita, encantadora. Mas
naquela noite, ela estava mais graciosa, vestia um vestido branco de alça com a
barra acima do joelho, calçava uma sandalinha rasteira, duas tranças nos
cabelos, ninguém via tristeza ou sofrimento, ela transpirava a ingênua
sensualidade das mocinhas do sertão. Rosa, era a bela flor que não parecia ser
nativa do lugar.
Por fim tenho que confessar, não a
tive como mulher, isso foi frustrante, nem como amiga, o que nunca cogitei,
ainda assim, aquela noite permanece em minha mente. Anos depois de ter ido
embora, soube da sua viuvez, agora vivia amasiada com um comerciante da cidade,
bem mais velho que ela. Quando lá vou visitar a parentada, coloco uma
cadeira com o assento de couro na calçada, passo horas revivendo aquela noite.
Chego a desenhar o corpo de rosinha no ar, e antes que se dissolva as curvas
imaginarias, beijo a mão. Ah! Vontade de ter arrancado o vestido branco de alça
com a barra acima do joelho que Rosinha vestia, mas era muito direita para
tanto despautério.
Farias. 12/01/ 2008.
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