PONTUANDO MINHA LEMBRANÇAS
Tudo que esteve conosco durante o nosso
tempo, pequeno, mas intenso, continua intacto. Ainda não tive coragem de jogar
fora.
Ontem mesmo, estava folheando um livro de
poesias do Mário Quintana, e encontrei um bilhete seu, no final dizia assim:
“te amo seu chato, você foi a única pessoa que me deu flores”. Fechei o livro
com o seu bilhete na mesma página, guardei debaixo da gramática dada de
presente a mim, por ti. Pois bem, reafirmo, tudo na nossa virtual casa, está
intacto.
As tuas cartas estão guardadas em um
grande pote vazio de maionese em cima da geladeira, o velho celular Nokia de
lanterninha com todas as suas mensagens é o meu passatempo, revejo-as todas as
noites. A nossa música é a canção tocada ao amanhecer, ela traz tua serena e
deliciosa presença, suavemente fico a valsar pela sala - dançando, viajando,
respirando o perfume que usaste naquele eternizado sim.
Sem nenhuma poeira, as coisas permanecem em
seu devido lugar, ao seu gosto, como deixaste, menos o teu retrato, durante o
dia deixo emborcado em cima da mesinha de vidro, onde ficava o bonsai comprado
naquela lojinha de artigos japonês. Ao lado está a escultura de uma baiana,
carinhosamente demos o nome da nossa amiga.
Peço desculpas por ter escondido quando
partiste, teu baby-doll azul desbotado, escolhido para dormir às quintas
feiras. Querida, até hoje nunca entendi o porquê das quintas feiras, só sei que
toda quinta feira você aparece em meus sonhos vestido no teu baby-doll azul
desbotado, fazendo pose. O antialérgico que esqueceste na bancada da televisão,
vence próximo ano. Ah! Como gostaria que as minhas lembranças também vencessem
próximo ano, mas elas não têm prazos.
Meu peito ainda vive secretamente à procura do teu.
As
madrugadas chuvosas!? Além de me fazerem tremer de frio, trazem a lembrança do
clarear dos relâmpagos que passavam pelas venezianas das janelas, você
apavorada, tão indefesa me abraçava, propositalmente entrelaçavam tuas longas
pernas brancas nas minhas. Sei que viajas por essas estradas secretas, nesse
labirinto onde se esconde os nossos segredos, sobretudo aqueles proibidos. Às
escondidas, vives, de vez enquanto, os que estão guardados no subterrâneo do
teu ser. Dizem que os olhos são o
espelho da alma, quem olhar nos teus olhos verá todas as cenas vividas, como
foi intensa, desejosa e sem medidas se entregavas a mim. Sou capaz de apostar
que já te escutaram baixinho sussurrar meu nome enquanto dormias. Não duvide,
fazias isso com frequência.
São pequenos detalhes inesquecíveis como estes, capazes de tornarem o
nosso passado, um presente. Por mais que queiramos construir um novo, jamais
será igual, construímos uma casa no abstrato com portas para serem abertas
somente por nós. Não penses que sou um
saudosista ou que ainda..., seria um grande engano, mas é porque tem hora que me dar uma vontade
de dizer que tudo com você foi mais.
Farias, 12/06/2015
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