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02 janeiro 2024

PONTUANDO MINHA LEMBRANÇAS

 

PONTUANDO MINHA LEMBRANÇAS

 

     Tudo que esteve conosco durante o nosso tempo, pequeno, mas intenso, continua intacto. Ainda não tive coragem de jogar fora.

    Ontem mesmo, estava folheando um livro de poesias do Mário Quintana, e encontrei um bilhete seu, no final dizia assim: “te amo seu chato, você foi a única pessoa que me deu flores”. Fechei o livro com o seu bilhete na mesma página, guardei debaixo da gramática dada de presente a mim, por ti. Pois bem, reafirmo, tudo na nossa virtual casa, está intacto.

     As tuas cartas estão guardadas em um grande pote vazio de maionese em cima da geladeira, o velho celular Nokia de lanterninha com todas as suas mensagens é o meu passatempo, revejo-as todas as noites. A nossa música é a canção tocada ao amanhecer, ela traz tua serena e deliciosa presença, suavemente fico a valsar pela sala - dançando, viajando, respirando o perfume que usaste naquele eternizado sim.

    Sem nenhuma poeira, as coisas permanecem em seu devido lugar, ao seu gosto, como deixaste, menos o teu retrato, durante o dia deixo emborcado em cima da mesinha de vidro, onde ficava o bonsai comprado naquela lojinha de artigos japonês. Ao lado está a escultura de uma baiana, carinhosamente demos o nome da nossa amiga.

     Peço desculpas por ter escondido quando partiste, teu baby-doll azul desbotado, escolhido para dormir às quintas feiras. Querida, até hoje nunca entendi o porquê das quintas feiras, só sei que toda quinta feira você aparece em meus sonhos vestido no teu baby-doll azul desbotado, fazendo pose. O antialérgico que esqueceste na bancada da televisão, vence próximo ano. Ah! Como gostaria que as minhas lembranças também vencessem próximo ano, mas elas não têm prazos.   Meu peito ainda vive secretamente à procura do teu.

      As madrugadas chuvosas!? Além de me fazerem tremer de frio, trazem a lembrança do clarear dos relâmpagos que passavam pelas venezianas das janelas, você apavorada, tão indefesa me abraçava, propositalmente entrelaçavam tuas longas pernas brancas nas minhas. Sei que viajas por essas estradas secretas, nesse labirinto onde se esconde os nossos segredos, sobretudo aqueles proibidos. Às escondidas, vives, de vez enquanto, os que estão guardados no subterrâneo do teu ser.  Dizem que os olhos são o espelho da alma, quem olhar nos teus olhos verá todas as cenas vividas, como foi intensa, desejosa e sem medidas se entregavas a mim. Sou capaz de apostar que já te escutaram baixinho sussurrar meu nome enquanto dormias. Não duvide, fazias isso com frequência.

      Recordo tua cara assustada, olhando teu vestido longo preto e branco que a corrente da motocicleta cortou quando passávamos do lado da segunda igreja do nosso bairro. Meu amor, foi muito hilário, mas também sensual, percebi que nunca tinha visto pernas tão brancas e tão lindas! Santa corrente, poderia ter arrancado o vestido todo, não havia ninguém na rua àquela hora.  E o luau que fizemos?  Fizeste eu roubar as flores de um jardim para enfeitar o ambiente e criar uma atmosfera lasciva. Foi bom, muito bom, digo melhor, foi extasiante! Você e eu ouvindo nossas canções, longe de todas as convenções sociais nos entregávamos sem virtude, sem pudor sem nenhuma preocupação em ferir tua decência. Nada era tão intenso quanto aquele momento.

       São pequenos detalhes inesquecíveis como estes, capazes de tornarem o nosso passado, um presente. Por mais que queiramos construir um novo, jamais será igual, construímos uma casa no abstrato com portas para serem abertas somente por nós.  Não penses que sou um saudosista ou que ainda..., seria um grande engano, mas é porque tem hora que me dar uma vontade de dizer que tudo com você foi mais.     

                                                                                                              Farias, 12/06/2015

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