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02 janeiro 2024

LÚCIA

 

LÚCIA

 

      Malta, interior paraibano, um daqueles povoados centrados no sertão, onde a vida passava lentamente sem as turbulências e os costumes da cidade grande. Pois, foi ali que nasceu e cresceu Lúcia, uma moça tão bela e radiante que contrastava com a paisagem sofrida e rústica daquele lugar. Todas as tardes, sem falhar um dia, eu colocava uma cadeira de balanço na calçada, só para vê-la passar quando voltava da igreja. Veja só! Lúcia, além de ser linda ainda roçava a santidade, dava aula de catecismo para a meninada da vila, era realmente uma santa. E por isso não devia olhar para ela de maneira tão licenciosa, embora me sentisse atraído pelas ancas avantajadas;

    Um dia, final de tarde, como de costume, veio pedir baygono, um tipo de inseticida para matar mosquitos, na minha casa, aliás, a casa de Lúcia devia ter muitos pernilongos, já que, pelo menos duas ou três vezes na semana, vinha pegar veneno. Não pense que sou avarento e estou lamentando. Pelo contrário o que seria de mim naquele lugar, sem os mosquitos da casa de Lúcia?! Direis portanto, convicto da graça presença dela lá em casa. Eu adorava quando ela vinha, trocávamos longos olhares, ela sempre terna, ria. Eu, libertino, a desejava.

    A noite caíra. Lúcia resolve ficar para conversar e assistir televisão, afinal, não nos restava outra coisa naquela pequena e pacífica vila. Sem que menos esperasse, mamãe resolveu ir dormir. Tudo se encaminhava conforme havia planejado, desde o momento que ela decidiu ficar. Finalmente, ficamos sozinhos. Logo que tudo silencia, Lúcia surpreende-me, levanta seu vestidinho florido até a altura dos seios e pergunta se eu a achava bonita. Ora! Para mim era linda com roupas, imagina seminua! Agora meu caro amigo José, preciso dizer: era uma tortura. Lúcia provocava, entretanto, não me permitia aproximar dela, sempre que ia ao seu encontro, apontava para o sofá dizendo incisivamente:

__ sente lá menino é só pra você vê. Sem resistência, atendia a ordem, permanecia sentado, enquanto dançava despudorada. Era uma coisa irreal para aquele lugar, se alguém a visse tão lasciva, não acreditava que fosse ela, e se alguma pessoa contasse algo parecido estava sujeita a ser expulsa da vila, ou iria parar na cadeia por falso testemunho, visto que, era uma pessoa acima de qualquer suspeita.

      Enfim, depois de tanto tormento que me causara, decidiu sentar do meu lado, encostou a face à minha e passou a segredar. Cada palavra dita, mostrava o ser primitiva que era., não havia força para suportar tanto desejo, seu corpo parecia convulsivo, ela sofrera o fenômeno da involução, já não mais falava, simplesmente grunhia. Senti então que era a minha hora. E quando de fato, ia tornar senhor daquele feérico momento, o velho sofá que estávamos não suportou tanta volúpia, range e quebra. O ranger pareceu-me um lamento por não poder ser cúmplice dos últimos instantes.

     O barulho acorda minha mãe. Ouvimos quando abriu a porta do quarto e dirigiu-se à sala arrastando o chinelo sempre que trocava a passada. Ao chegar, olhou para mim e perguntou o que tinha acontecido. Lúcia, sentadinha e imaculada como sempre aparentou ser, não me deixou responder, tomou a frente e disse:

__não foi nada, dona Maria, foi o Frederico que pulou da estante para cima do birô”. Mamãe ficou convencida, voltou ao quarto, sem hesitar, pois, conhecia muito bem o Frederico, sabia que não existia gato mais travesso do que ele.

      Bom, como Lúcia já estava composta de roupa, e era tarde, precisava ir para casa, e certamente, minha mãe esperava por isso. Pois, foi justamente o que fizemos. Antes de sair aproximei do ouvido dela, perguntei se viria amanhã. Não confirmou nada, apenas mostrou o frasco cheio da encomenda que fora buscar. Desolado? Até fiquei, todavia, tinha certeza que a nossa história não chegara ao fim, cedo ou tarde, Lúcia estaria batendo à porta, trajando de propósito, o mesmo vestidinho florido, o frasco de maionese na mão dizendo:

__ dona Maria, a senhora tem baygon?

                                                                                                                         Farias 1999

 

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